QUANDO A ESCOLA É DE VIDRO.
Trecho do livro de Ruth Rocha
Eu ia a
escola todos os dias de manhã e quando chegava, logo, logo, eu tinha que me
meter no vidro. É, no vidro! Cada menino ou menina tinha um vidro e o
vidro não dependia do tamanho de cada um, não! O vidro dependia da classe em
que a gente estudava.
Se você estava no primeiro ano, ganhava um vidro de um tamanho. Se você fosse do segundo ano, seu vidro era um pouquinho maior.
E assim, os vidros iam crescendo à medida
que você ia passando de ano. Se não passasse de ano era um horror. Você
tinha que usar o mesmo vidro do ano passado.
Coubesse ou não coubesse. Aliás nunca ninguém se preocupou em saber se a gente cabia nos vidros. E para falar a verdade, ninguém cabia direito. Uns eram gordos, outros eram muito grandes, uns eram pequenos e ficavam afundados no vidro, nem assim era confortável.
A gente
não escutava direito o que os professores diziam, os professores não
entendiam o que a gente falava, e a gente nem podia respirar
direito... A gente só podia respirar direito na hora do recreio ou na
aula de educação física. Mas aí a gente já estava desesperado de tanto ficar
preso e começava a correr, a gritar, a bater uns nos outros.
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O hábito de ficar dentro dos vidros acaba se tornando cômodo
para algumas crianças, elas se adaptam à forma do vidro e acabam se sentindo até
desconfortáveis fora dele. Quanto mais elas se moldam ao vidro menos trabalho
dão aos adultos. Outras, porém, sofrem porque são diferentes e esta diferença
não é levada em conta; elas não recebem nenhum tipo de ajuda e de
estímulo.
Mas será que é isso que se quer do processo educacional? Todo
mundo pensando igual e fazendo tudo igual? O vidro filtra o que o
professor fala e também o que fala o aluno. A comunicação e portanto as
relações entre eles não são espontâneas. Ouvir é diferente de escutar ativamente,
é muito diferente!
Em se tratando de crianças e adolescentes, há que se fazer um
esforço extra para entender exatamente o que eles querem dizer! Mesmo assim,
com todo nosso esforço e atenção, quantas perguntas deixaram de ser formuladas
e quantas outras deixaram de ser respondidas!
As crianças que ficaram tempo demais dentro de vidros adoram
as aulas de educação física. O corpo do aprendiz faz parte dele, é através do
corpo que ele fala, que expressa seus sentimentos e que ele aprende.
Assim há muitas
maneiras de aprender e todas elas devem ser colocadas à disposição do
aprendiz. Um dia teremos a revolução dos vidros, e a diferença, não mais a
mesmice, será valorizada!
A psicopedagogia lida essencialmente com a aceitação dessas
diferenças, tentando entendê-las. É através da busca de novos caminhos que ela
pretende dar um novo significado à aprendizagem.
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